PArtiMus

PArtiMus – Pesquisa artística em Música – Criação e Experimentação

Programa de Pós-Graduação em Música da UFRJ – PPGM-UFRJ
Área de Conhecimento – Processos Criativos
Linha de Pesquisa – Poéticas da Criação Musical

Equipe

  • Pauxy Gentil-Nunes, docente responsável (UFRJ)
  • Marcos Sampaio, docente (UFBA)
  • Marina Spoladore, docente (Unirio)
  • Pedro Bittencourt, docente (UFRJ)
  • Angelica Faria, pesquisadora (Uerj)
  • Petrucio Vianna, docente (UFF)
  • Bernardo Ramos, doutorando (UFRJ)
  • Pedro Moraes, doutorando (UFRJ)
  • Luan Simões, mestrando (UFRJ)
  • Jonas Hocherman, mestrando (UFRJ)
  • Sergio Ribeiro, egresso (UFMT)

Apresentação

No quadriênio 2017-2020, a formulação de novos jogos criativos no âmbito da Análise Particional levou à inclusão do corpo e da materialidade em suas diversas aplicações (Ramos e Gentil-Nunes, 2020; Gentil-Nunes, 2020; Ramos, 2017). Essa foi uma consequência natural da abordagem pragmática, que apontou, através dos Complexos Particionais, um caminho analítico centrífugo (e, nesse sentido, oposto complementar à teoria Schenkeriana) a partir da chamada “estrutura” musical para seu contexto material e, em última instância, social (Gentil-Nunes, 2018).

Particionamento Performativo trata das relações de independência e interdependência entre parte do corpo (dedos, mãos, aparelho respiratório) e elementos instrumentais (cordas, trastes, chaves, teclas, pedais, etc.; ver Gentil-Nunes, 2016). Tratam-se de unidades coreográficas, que podem ser transpostas, inclusive, para fora do domínio musical, com aplicações em campos artísticos diversos. No momento, alguns deles estão sendo alvo de projetos artísticos específicos: dança, cinema e literatura. No campo da música, a pesquisa da performatividade cria uma conexão entre as pesquisas em composição e performance, com contribuições significativas ao processo composicional, mas também à pedagogia da instrumentação e orquestração (a contribuição para o campo dos estudos em performance ainda é uma proposta para trabalhos futuros).

Nesse sentido, a homologia encontrada entre os diversos campos representáveis no particiograma, que permite a transdução entre campos aparentemente heterogêneos entre si, vai encontrando soluções de expansão para fora da pesquisa em música. A cada particionamento corresponde um comportamento específico: coreográfico, narrativo, fotográfico, espacial ou instrumental, de tal forma que é possível verter um parâmetro no outro, mantendo relações e proporções básicas, dentro do sentido de cada campo.

Por outro lado, essas homologias e estruturas recorrentes se situam em contextos históricos e culturais, que ressignificam seus sentidos e afetos. Urge entender como a reprodução de padrões particionais em seus vários contextos podem levar a conteúdos distintos, e até que ponto algo comum da estrutura particional resiste ao impulso hermenêutico contingente. Um dos caminhos delineados no processo de pesquisa para a investigação desses desdobramentos é a Autoetnografia, principalmente em sua modalidade Colaborativa (Chang, 2008; Chang et al., 2013).

Segundo Silvio Matheus Santos,

“ (…) a autoetnografia é um método que se sustenta e se equilibra em um “modelo triádico”, baseado em três orientações: a primeira seria uma orientação metodológica – cuja base é etnográfica e analítica; a segunda, por uma orientação cultural – cuja base é a interpretação: a) dos fatores vividos (a partir da memória), b) do aspecto relacional entre o pesquisador e os sujeitos (e objetos) da pesquisa e c) dos fenômenos sociais investigados; e por último, a orientação do conteúdo – cuja base é a autobiografia aliada a um caráter reflexivo. Isso evidencia que a reflexividade assume um papel muito importante no modelo de investigação autoetnográfico, haja vista que a reflexividade impõe a constante conscientização, avaliação e reavaliação feita pelo pesquisador da sua própria contribuição/influência/forma da pesquisa intersubjetiva e os resultados consequentes da sua investigação”. (SANTOS, 2017 p. 218).

Os estudos autoetnográficos permitem a pesquisa em campos de conhecimento ainda pouco explorados – aqueles que dependem intrinsecamente da subjetividade do pesquisador. Vários autores têm se dedicado à pesquisa autoetnográfica aplicada a práticas artísticas diversas (Manovsky, 2014). Essas iniciativas vêm construindo um novo campo, em que a arte é tomada como paradigma para a produção de conhecimento e o foco se concentra nos processos criativos – a Pesquisa Baseada em Arte (Arts-based Research), ou Pesquisa Artística (Iosefo et al., 2021; Van der Vaart et al., 2018; Leavy, 2019 e 2015; Santos, 2017).

Grande parte do desenvolvimento da metodologia autoetnográfica se sustenta na proposta de criar bases éticas e epistemológicas honestas para a investigação subjetiva (Magalhães, 2018; Ellis, 2007).

Nesse caminho, a autoetnografia leva à crítica da separação estrita entre compositor e performer, vista como uma prática herdada de tradições normalizadas, assim como à reflexão crítica sobre os processos criativos em uma visada mais ampla, trazida das vivências dos sujeitos envolvidos, abrangendo assim estilos e gêneros ainda pouco cobertos pela academia.

Com relação à abordagem pragmática, o conceito de jogos de Wittgenstein é detalhado eu suas Investigações Filosóficas (1945/2009) e em seu livro sobre os fundamentos da matemática (1956/2001). Esse conceito é central no processo de expansão da Teoria Particional para o campo da Pesquisa Artística (Gentil-Nunes, 2012; 2009). Ainda que a Análise Particional permita a investigação musicológica sistemática a respeito do uso da textura ou de outras dimensões musicais correlatas, seu uso como instrumento de autoconhecimento artístico e desenvolvimento de potencialidades criativas para o compositor é mais importante e constitui sua principal finalidade.

Dessa forma, a pesquisa sobre o campo teórico e matemático da Análise Particional passa a se colocar como ferramenta de apoio para a investigação sobre o sujeito criador e para a relação com seu próprio trabalho, em um contexto autoetnográfico.

Em torno do projeto de pesquisa “Superfície e estrutura em aplicações da Análise Particional”, desenvolvido no PPGM-UFRJ no período de 2018 a 2021, um grupo de pesquisadores vem então se debruçando sobre as questões levantadas pela expansão dessa metodologia de investigação sobre as estruturas que se formam na superfície musical, derivadas do estudo da textura. As produções e encontros periódicos realizados desde então levaram à elaboração do projeto “Pesquisa artística e autoetnografia em composição musical”, desenvolvido a partir de 2022, assim como à presente proposta de criação do grupo. 

Métodos

O grupo de pesquisa PArtiMus pretende tomar como um de seus principais eixos metodológicos a autoetnografia de caráter colaborativo, preservando, por outro lado, a contribuição das metodologias inerentes à Linha de Pesquisa (análise musical, reflexões filosóficas e estéticas sobre o processo criativo, desenvolvimento de corpos teóricos). O pragmatismo do segundo Wittgenstein, desenvolvido posteriormente por seus tributários (Meyer, mas também Lyotard, Habermas, Becker, entre outros) se coloca como a principal referência epistemológica.

Objetivos

Geral: Contribuir com a disseminação e desenvolvimento da Autoetnografia Colaborativa no âmbito do Programa, da Escola de Música da UFRJ e de seus parceiros. Enriquecer o debate local, regional e nacional sobre a pesquisa artística e o desenvolvimento da pesquisa interdisciplinar em arte envolvendo a criação musical. Promover a reflexão local sobre o processo criativo e fornecer ferramentas alternativas para o desenvolvimento da potência estética e criativa de alunos em geral.

Específicos: (1) Realização de eventos acadêmicos (Congressos, Simpósios, Palestras, Cursos etc.) e artísticos (Concertos, Shows, Masterclasses etc.) que expressem os conceitos e técnicas desenvolvidas no campo da Pesquisa Artística ou da Autoetnografia Colaborativa; (2) Publicação de trabalhos científicos e artísticos (Anais de Congresso, Livros, Exposições, Partituras, Concertos, CDs, DVDs, produtos digitais etc.); (3) apoiar o intercâmbio de pesquisadores especializados no campo de interesse do grupo (Professores Visitantes, Pesquisadores em trabalho de campo, alunos em missões ou estágios no exterior). 

Justificativa

A Pesquisa Artística é um campo do conhecimento em franca expansão em âmbito internacional, contando com uma estrutura de periódicos, congressos, departamentos e grupos de pesquisa. No Brasil, a pesquisa artística em música ainda está em processo de consolidação. Da mesma forma, a Autoetnografia Colaborativa é uma metodologia ainda em processo de disseminação no país, principalmente no campo das artes e especificamente no campo musical.

Instituições e pesquisadores parceiros

  • Departamento de Comunicação e Arte da Universidade de Aveiro
  • Programa de Pós-graduação em Música da UFMG
  • Instituto de Matemática e Estatística da UFF
  • Programa de Engenharia de Sistemas e Computação – COPPE/UFRJ
  • Departamento de Composição, Literatura e Estruturação Musical da UFBA
  • SYKE – Finnish Environment Institute
  • Intercultural Art and Healing Project
  • Grupo de Pesquisa Performance Hoje (PPGM-UFRJ)

Referências

Chang, Heewon. Autoethnography as method. Walnut Creek, CA: Left Coast Press, 2008.

Chang, Heewon; Ngunjiri, Faith; Hernandez, Kathy-Ann. Collaborative Autoetnography. Walnut Creek: Left Coast, 2013.

Ellis, Carolyn. Telling Secrets, Revealing Lives: Relational Ethics in Research with Intimate Others. Qualitative Inquiry, v. 13, n. 1 (January 2007), pp. 3-29

Ellis, Carolyn; Bochner, Arthur. Composing Ethnography – Alternative Forms of Qualitative Writing. Walnut Creek: Altamira, 1996.

Ellis, Carolyn; Flaherty, Michael. Investigating Subjectivity: Research on Lived Experience. Newbury Park: Sage, 1992.

Gentil-Nunes, Pauxy. Reading Textural Functions, Instrumental Techniques, and Space through Partition Complexes. MusMat: Brazilian Journal of Music and Mathematics, v. 4, n. 2, 2020.

Gentil-Nunes, Pauxy. Nesting and Intersections between Partitional Complexes. MusMat: Brazilian Journal of Music and Mathematics, v. 2, n. 1, 2018, p. 93-108.

Gentil-Nunes, Pauxy. Formalização do espaço textural melódico em instrumentos monofônicos. XXVI Congresso da ANPPOM. Proceedings… Belo Horizonte: UFMG, 2016.

Gentil-Nunes, Pauxy. Contribuições da virada lingüístico-pragmática de Wittgenstein para o entendimento das relações musicais. In: Volpe, Maria Alice (ed.). Teoria, crítica e música na atualidade – série Simpósio Internacional de Musicologia da UFRJ. Rio de Janeiro: UFRJ, 2012.

Gentil-Nunes, Pauxy. Análise particional: uma mediação entre composição musical e a teoria das partições. Tese de Doutorado. Rio de Janeiro: UNIRIO, 2009.

Hannula, Mika; Suoranta, Juha; Vadén, Tere. Artistic Research Methodology – Narrative, Power and the Public. Helsinki: Peter Lang, 2014

Iosefo, Featui; Jones, Stacy; Harris, Anne. Wayfinding and Critical Autoethnography. London: Routledge, 2021.

Leavy, Patricia. Method Meets Arts: Arts-Based Research Practice. New York: Guilford, 2015.

Leavy, Patricia. The Oxford Handbook of Qualitative Research. New York: Oxford University, 2014.

Leong, Daphne. Performing Knowledge. New York: Oxford University, 2019.

López Cano, Rúben. Pesquisa artística, conhecimento musical e a crise da contemporaneidade. ARJ Brasil, v. 2, n. 1 (jan. – jun. 2015), pp. 69-94.

Magalhães, Célia. Autoetnografia em contexto pedagógico: entrevista e reunião como lócus de investigação. Veredas, v. 22, n. 1, 2018, pp. 16-33.

Manovski, Miroslav. Arts-Based Research, Autoethnography, and Music Education. Rotterdam: Sense Publishers, 2014.

Ramos, Bernardo. Análise de Textura Violonística: teoria e aplicação. 2017. Dissertation (Master Degree, Music). Universidade Federal de Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2017.

Ramos, Bernardo; GENTIL-NUNES, Pauxy. (2020). Parsimonious Relations Between Guitar Textural Proposals. Vórtex Music Journal, v. 8, n. 3. Available in: http://vortex.unespar.edu.br/ramos_gentilenunes_v8_n3.pdf, accessed on 26/12/2020.

Santos, Silvio. O método da autoetnografia na pesquisa sociológica: atores, perspectivas e desafios. PLURAL, Revista do Programa de Pós‑Graduação em Sociologia da USP, São Paulo, v.24, n. 1, 2017, p.214-241

Sheperd, John. Music and Social Categories. In: Clayton, Martin. Herbert, Trevor. Middleton, Richard. Cultural Study of Music – A Critical Introduction. New York: Routledge. 

Van der Vaart, Gwenda; Van Hoven, Bettina; Van Hoven, Paulus. Creative and Arts-Based Research Methods in Academic Research. Lessons from a Participatory Research Project in the Netherlands. FQS, Volume 19, No. 2, Art. 19 – May 2018

Wittgenstein, Ludwig. Investigações filosóficas. Tradução de Marcos G. Nontagnoli. Petrópolis: Vozes, 1945/2009.Wittgenstein, Ludwig. Remarks on the foundation of mathematics. Tradução de G. E. M. Anscombe. Oxford: Basil Blackwell, 1956/2001.